O que é ser mulher e ser negra na sociedade atual? A pergunta foi o mote da palestra da jornalista e escritora Jaqueline Fraga, que falou sobre o conceito de interseccionalidade, na aula inaugural do Curso Dandara Dos Palmares – Gênero, Raça e Etnia na Comunicação. Realizada na última terça-feira (01/10), no auditório Murilo Aguiar, na Assembleia Legislativa do Estado, a atividade contou com ato político-cultural contra a violência de gênero e o racismo. “A mulher negra é o outro do outro”, frisou a palestrante, citando autoras negras como a baiana Carla Akotirene.
“Interseccionalidade é um conceito sociológico que estuda as interações nas vidas das minorias, entre diversas estruturas de poder. Então, a Interseccionalidade é a consequência de diferentes formas de dominação ou de discriminação. Ela trata das interseções entre estes diversos fenômenos”, explicou a jovem jornalista, que é autora do livro-reportagem “Negra Sou: a ascensão da mulher negra no mercado de trabalho”.
De acordo com Fraga, o poder é estruturado por marcações de gênero, raça, etnia e orientação sexual, resultando numa sociedade racista e cisheteropatriarcal, incluindo a esfera da Comunicação. Assim, a comunicação necessita ressarcir os apagamentos linguísticos e as formulações de mulheres, brancas e, sobretudo negras, cis e trans. “A gente precisa se ver. Somos nós falando sobre nós”, disse a palestrante, destacando iniciativas como os sites “Notícias Pretas”, “Alma Preta e “Geledés” – todos com conteúdos que vão além de notícias, incluindo artigos, educação e entretenimento.
“Então a gente estuda racismo, machismo, LGBTFobia e todos os tipos de preconceito justamente para combatê-los. Inclusive, nas matérias que a gente produz”, destacou Jaqueline Fraga. Ela deu exemplos de títulos e abordagens em matérias jornalísticas em que as pessoas negras são tratadas como criminosas. Sobre a homenagem a Dandara dos Palmares na formação do Sindjorce e da FENAJ, a jornalista destacou que Dandara dos Palmares lutou pela libertação total das negras e negros no Brasil, liderando mulheres e homens.
“Essa reverência, esse entendimento de que muitas vieram antes de nós e que fizeram muito para estramos aqui hoje, é muito importante. É consciência.E só quando nós temos consciência da nossa história é que nós podemos fazer valer os nossos direitos. Lutar para que todos tenhamos as mesmas oportunidades, as mesmas liberdades”, frisou.
Falas destacaram luta e diversidade de representação
Antes da palestra, a cantora Luiza Nobel, acompanhada da percursionista Jully, fizeram uma performance musical ressaltando as africanidades presentes nos instrumentos e as lutas do povo preto. Além da palestrante, os presentes puderam ouvir as falas da anfitriã do espaço, deputada Augusta Brito; da Secretária de Mulheres do PT, Fátima Bandeira; da segunda vice-presidenta da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Samira de Castro; e da secretária-geral do Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce), Luizete Vicente.
Parceira da formação, por meio da Procuradoria Especial da Mulher da Assembleia Legislativa do Ceará (PEM), a deputada Augusta Brito destacou que as mulheres continuam lutando pelo direito de viverem livres, como Dandara dos Palmares. A jornalista Fátima Bandeira, da Secretaria Estadual de Mulheres do PT, destacou que o curso vai possibilitar os alunos retratarem em suas produções, as várias mulheres: negras, brancas, cis, trans, lésbicas e hétero. “Porque nós somos diversas”, completou.
Citando Conceição Evaristo, a segunda vice-presidenta da FENAJ, Samira de Castro, destacou que “a noite não adormece nos olhos das mulheres porque a luta é constante contra a invisibilização, contra o machismo e o capitalismo”. Destacou a necessidade de formação complementar para os profissionais da mídia e evocou Dandaras dos Palmares e dos Santo, Marielles, Ágathas, Penhas, Margaridas Alves e Cláudias Sílvias Ferreira.
A secretária-geral do Sindjorce, Luizete Vicente, destacou a importância da consciência das mulheres negras e do legado de representação e representatividade passado por cada mulher preta por meio de gerações. “A gente tem de dizer de onde vem: nome e sobrenome”. Falou, também, sobre a importância da produção de conhecimentos e saberes na academia. “As mulheres negras do nosso continente precisam formular, produzir e discutir cada vez mais”, pontuou.
Texto: Samira de Castro
Fotos: Claudiane Lopes