Há dois anos sem reajustes, jornalistas cearenses enfrentam prorrogação de reduções salariais e suspensões contratuais

Do final de março a setembro desse ano, 202 jornalistas cearenses foram impactados pelas medidas. Somente em uma redação, a perda salarial acumulada soma R$ 355,1 mil em seis meses

Pelo menos 30 jornalistas demitidos, desde o início da crise sanitária até o mês de setembro, incluindo na conta três profissionais que tiveram contratos suspensos por um período de 60 dias

Há dois anos sem receber reajustes – em função do não fechamento das campanhas salariais -, os jornalistas cearenses enfrentam queda nos rendimentos e empobrecimento, em decorrência da prorrogação, por parte das empresas jornalísticas, das medidas de redução salarial e suspensão contratual. Na prática, já são seis meses de encolhimento no contracheque, ao mesmo tempo em que os operários da notícia são ainda mais demandados para cobrir tanto a pandemia de Covid-19 como as eleições municipais.

Previstas na Lei Nº 14. 020/2020 (antiga MP 936, de 1º de abril) e implantadas no Ceará ainda em abril e no início de maio desse ano, as medidas de redução salarial/jornada e suspensão contratual foram adotadas pelos empregadores tendo como justificativa a queda da atividade econômica e, consequentemente, das receitas publicitárias nos veículos de mídia. A legislação prevê que essas condições podem ser ampliadas enquanto durar a pandemia, por decreto presidencial.

Um novo decreto editado pelo presidente Jair Bolsonaro (ex-PSL), no último dia 14 de outubro, prorroga pela terceira vez o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEM), que permite as empresas suspender contratos de trabalho e reduzir salário e jornadas.

Redução da massa salarial e empobrecimento

Aderiram à legislação os maiores grupo de Comunicação do Estado – Sistema Verdes Mares, O Povo e Jangadeiro -, além de empresas de assessoria de imprensa, entidades do terceiro setor, revistas e outros empregadores. De abril até o momento, o Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce) contabiliza 202 profissionais atingidos no Estado, conforme contratos encaminhados pelas empresas à direção sindical.

Somente em uma redação, a perda salarial acumulada soma R$ 355,1 mil em seis meses, uma vez que a empresa não aplicou qualquer medida compensatória. Dessa forma, os jornalistas estão sofrendo perdas significativas de renda já que o benefício pago pelo governo não chega a suprir o salário reduzido na mesma medida.

Cabe destacar que houve o registro de pelo menos 30 jornalistas demitidos, desde o início da crise sanitária até o mês de setembro, incluindo na conta três profissionais que tiveram contratos suspensos por um período de 60 dias. Ou seja, estes, além de receberem bem menos, em função da não reposição integral dos salários pelas medidas compensatórias do governo, ainda perderam seus empregos ao final da suspensão contratual.

“Esses dados são alarmantes, sobretudo, se levarmos em consideração uma categoria que já vem com salários defasados há dois anos e cujos empregadores querem, ao longo desse tempo, retirar praticamente todos os direitos convencionados”, avalia o presidente do Sindjorce e diretor de Mobilização e Negociação Salarial da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ), Rafael Mesquita.

O Sindicato laboral vem entrando em contato regularmente com as redações de toda sua base sindical, acompanhando todos os casos que envolvem a aplicação da Lei Nº 14. 020/2020.

Trabalho decente é essencial

Campanha veiculada pelos jornais associados a ANJ, no começo da pandemia, ressaltando o papel do jornalismo no combate ao Coronavírus

Para Mesquita, nada justifica a dificuldade dos representantes patronais em negociarem as convenções coletivas de trabalho e a aplicação dos reajustes salariais represados, sobretudo porque se referem a períodos anteriores à pandemia de Covid-19. “Estamos falando de reajustes que, se aplicadas as inflações dos dois períodos, resultam em diferenças salariais que não somam R$ 250,00 por trabalhador. Ou seja, a categoria só reivindica a manutenção do seu poder de compra que, neste caso, significa a sobrevivência em meio a uma crise sem precedentes na história da humanidade”, pontua.

O dirigente sindical acrescenta que, a despeito de todas as campanhas de marketing que os grandes veículos fizeram nessa pandemia, destacando a essencialidade dos serviços de Comunicação e do trabalho dos jornalistas profissionais no combate à desinformação, a prática dos patrões demonstra um total descaso com os trabalhadores, que nunca pararam de trabalhar, se expondo aos riscos de contrair uma doença totalmente desconhecida.

Campanha do Sistema Verdes Mares ressalta o jornalismo profissional, mas trabalhadores seguem sem reajustes salariais há dois anos

“Somos essenciais, mas nossos salários são uma miséria”, afirma Mesquita. Para ele, sem salários dignos, as campanhas das empresas jornalísticas não passam de peças publicitárias para atrair mais leitores, telespectadores e ouvintes, sem que esse aumento de audiência seja revertido em trabalho decente para os jornalistas. “O jornalismo profissional é feito por jornalistas. Não adianta fazer publicidade da atividade no combate às fake news e ignorar as reivindicações do trabalhadores por reajuste salarial”, pontua.

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