Jornalista assistido pelo Sindjorce ganha ação por dano moral contra jornal O Estado

Decisão é exemplar para questões de defesa do livre exercício profissional de jornalistas

A 11ª Vara do Trabalho de Fortaleza, por meio da juíza substituta Rafaela Soares Fernandes, condenou a Rede Independente de Jornais do Nordeste LTDA, razão social do jornal O Estado, a pagar indenização por dano moral no valor de R$ 10 mil a um jornalista suspenso por três dias sem motivação justa e alvo de humilhação diante da redação.

Independentemente do valor arbitrado pela magistrada, a sentença é uma peça pedagógica e serve para mostrar que os patrões não podem tudo, quando se trata da relação com seus empregados, conforme avalia o presidente do Sindicato dos Jornalistas do Ceará (Sindjorce), Rafael Mesquita.

Entenda o caso

O jornalista era funcionário do jornal O Estado desde outubro de 2011, atuando na função de Editor de Jornalismo Online, tendo sido dispensado sem justa causa no dia 10 de janeiro de 2019. Pretendeu, com a reclamação trabalhista, o pagamento de dano extrapatrimonial em virtude da suspensão infundada aplicada pela empresa dentro do ambiente de trabalho, bem como da humilhação sofrida diante de toda a redação do jornal.

Em janeiro de 2019, em meio à crise de segurança que então assolava o Estado do Ceará, ocasião em que diversos ônibus foram incendiados e a violência urbana se exacerbava na cidade, o jornalista realizou postagem jornalística de um vídeo no qual o Governador do Estado, Camilo Santana, afirmava que “não existia crise de segurança no Estado do Ceará”.

Após a publicação, o jornalista tomou conhecimento, por meio do Setor de Recursos Humanos da empresa, que estaria recebendo uma “suspensão” por “desídia”, isto por supostamente ter “violado as regras da empresa” sem, contudo, ter sido informado sobre qual fato específico, na reportagem publicada, teria ensejado a punição. Diante da ilegalidade da suspensão, acreditando na inexistência de falta funcional, o jornalista negou-se a assinar o documento.

No dia útil seguinte, o jornalista retornou ao trabalho e foi abordado por sua superiora hierárquica, sócia diretora do Jornal O Estado, que, segundo ele, “em tom ríspido e autoritário, o repreendeu e humilhou diante de toda a redação do Jornal”. A conversa realizada foi gravada em áudio e serviu como prova inequívoca na situação vivenciada pelo trabalhador.

Na prova oral produzida, de suma importância para o deslinde da controvérsia, o autor chega no jornal e discute com a superiora acerca do retorno ao trabalho, a despeito da suspensão aplicada. Na discussão, iniciada pela sócia diretora da empresa, o jornalista questionou o porquê da sua suspensão e a empregadora não soube explicar.

Além de alegar que o jornalista não havia seguido uma norma da empresa, que a própria dona não conseguiu evidenciar qual era e se esta se quer existia, a gravação mostra que a empresária se dirigiu ao funcionário em tom de voz alterado, na frente de todos os demais trabalhadores presentes. Ao informar que estava gravando a discussão, ela responde: “Gravou? eu não tenho medo de sindicato! E eu também não tenho medo de ameaça de funcionário dizendo que vai pra sindicato não! Pode postar lá no Sindicato isso!”.

Fundamentação da juíza

De acordo com a magistrada, para o esclarecimento do caso, três principais pontos foram avaliados: “Primeiramente a validade da suspensão aplicada ao autor (o jornalista); em segundo lugar, se o autor provocou a discussão ensejada na conversa anexada aos autos e; em terceiro lugar, se o autor efetivamente sofreu abalo de ordem moral em razão da situação a qual fora submetida, de modo a violar o exercício da liberdade pessoal e profissional”.

Pela sentença, a juíza considerou que não houve desídia por parte do jornalista, o que seria o motivo alegado para a injusta suspensão de três dias. “A suspensão disciplinar atua como medida mais drástica. Aplicar uma suspensão em razão de desídia no desempenho das funções pelo descumprimento de uma norma uma única vez e repassada ao empregado na forma oral, cuja veracidade sequer foi trazida a estes autos – uma vez que a ré não apresentou qualquer comprovação documental ou testemunhal da mencionada norma -, fere de morte a razoabilidade da medida”, pontua a magistrada.

Sobre a argumentação da empresa de que havia a norma de passar para a direção todas as publicações sobre o Governo do Estado, “para saber se era notícia verídica”, restou comprovado que essa norma não existe em manual ou documento impresso. Além disso, a juíza considerou que a matéria em questão era verídica e já havia sido reproduzida em outros veículos jornalísticos.

Ainda na decisão, a juíza considerou que o jornalista conversou com sua superiora apenas para entender porque estava sendo suspenso e que não foi ele a ensejar a discussão, como alega a dona do jornal.

Dano moral

Por fim, restou provado, com o trabalho prestado pela Assessoria Jurídica do Sindjorce, que uma vez descabida a punição aplicada e injustificado o comportamento da ré ao esclarecer os motivos da aplicação da punição, o autor sofreu abalo de ordem moral.

“Verifica-se, da análise do caso concreto, que a limitação ao livre exercício da sua profissão atingiu de forma negativa a intimidade, a honra e a imagem do autor, o qual já contava com mais de 10 anos de jornal, nunca antes tendo se deparado com uma situação como esta, de aplicação de uma punição injustificada e de constrangimento em meio aos demais empregados do jornal, o que abala sobremaneira a imagem diante dos colegas profissionais, bem como fere frontalmente o exercício livre do seu mister profissional”, pontuou a magistrada.


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